Notícia
No dia 8 de março, enquanto o mundo celebra o Dia Internacional da Mulher, a Associação Médica do Rio Grande do Sul (AMRIGS) lança um olhar especial sobre as mulheres que quebraram barreiras e se destacaram como protagonistas na Medicina. Relatos de quatro figuras inspiradoras – Dóris Hexel, Themis Reverbel, Fabíola Perin e Sandra Fuchs – revelam histórias de coragem, resiliência e excelência profissional. Essas mulheres não apenas fizeram história, mas também continuam a deixar sua marca na atualidade, iluminando o caminho para as gerações futuras.
No Brasil, a história da Medicina é enriquecida por nomes como Rita Lobato Velho Lopes, Ermelinda Lopes Vasconcelos e Antonieta César Dias, três gaúchas que se destacaram como pioneiras ao obterem seus diplomas médicos em outros estados, desbravando novos horizontes e pavimentando o caminho para a construção de muitas vitórias.
Quatro histórias inspiradoras
Dra. Dóris Hexsel, uma pioneira na Dermatologia
A escolha pela Medicina foi precoce. Ainda na infância e confirmada na adolescência, Dra. Dóris Hexsel, gostava de cuidar de pessoas. Escolheu a Dermatologia, por ter se encantado com esta especialidade desde o primeiro dia de aula.
“Quando cursei Medicina na UPF, já existiam muitas mulheres médicas e o maior desafio que enfrentei era coordenar o curso médico e, posteriormente, a profissão com a maternidade e as tarefas que, como mulher, desempenhamos em casa. Mas desafios, como dizia meu pai, ‘abatem os fracos, mas tornam os demais mais fortes’”, contou.
Ainda na década de 90, desenvolveu pioneiramente o tratamento cirúrgico da celulite, uma condição não muito estudada até há pouco tempo. Com reconhecimento internacional, o método atualmente é a primeira escolha de tratamento para as lesões mais frequentes de celulite.
“Publiquei trabalhos originais internacionalmente, muitos realizados com recursos próprios. Isso significa que enfrentei também o desafio de fazer pesquisa na área de cosmética, investindo em pesquisa. Se valeu a pena? Valeu muito, porque a pesquisa nos leva às fronteiras do conhecimento e nos permite ser tecnicamente muito melhores”, completou Dra. Dóris.
Dra. Doris Hexsel é associada e membro ativo de algumas das Sociedades de Dermatologia de maior prestígio no mundo, incluindo a Academia Americana de Dermatologia (AAD), a Sociedade Americana de Cirurgia Dermatológica (ASDS) – tendo sido a primeira médica brasileira a receber uma premiação do presidente -, a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), a Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica (SBCD), tendo sido presidente do Congresso Brasileiro de Cirurgia Dermatológica em 2014. Ela também é membro da Sociedade Internacional de Cirurgia Dermatológica (ISDS), ocupando atualmente o cargo de presidente da ISDS.
Dra. Themis Reverbel: um nome de destaque na Gastroenterologia
Ela é uma das precursoras em gastroenterologia no Brasil. Aos 85 anos, Themis atuou como diretora do Hospital Santo Antônio de 2013 a 2020. Atualmente atende no consultório e é professora na pós-graduação de Pediatria da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). Doutora em Medicina Genética pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pela King’s College Hospital, de Londres, é também pesquisadora no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 2022, em uma solenidade realizada no auditório do Complexo Hospitalar Santa Casa, recebeu o título de Membro Emérito do Corpo Clínico pela trajetória no exercício da Medicina e da missão institucional, com sublime humanidade e excelência profissional.
“Como médica, minha maior lição foi acompanhar as crianças, os adolescentes e suas famílias nos transplantes de fígado do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. O dia a dia neste local, convivendo com aqueles que aguardam a esperada doação de órgãos, me possibilitou valorizar na sua plenitude: solidariedade, generosidade, entrega, e a repensar o significado da responsabilidade, de poder contribuir para a felicidade dos outros. Conviver, de um lado, com a esperança de quem recebe uma nova oportunidade de vida e, de outro, com a suprema dor de quem perdeu um ente querido ensina a humildade e estimula a coragem”, conta.
A médica destaca com orgulho a conquista do respeito e do crescente espaço da mulher na Medicina, que hoje ocupa mais da metade das vagas.
“Sou feminista de carteirinha desde sempre. Em 1958, quando iniciei na Faculdade de Medicina, um dos “trotes” preferidos dirigidos às raras “calouras” era a obrigação de servir cafezinho, para os veteranos, no Centro Acadêmico Sarmento Leite, sorrindo e cantando: ‘Medicina é papa fina, não é coisa prá menina’. Cá estou eu, provando o contrário”, recorda.
Dra. Fabíola Perin: pioneirismo no transplante pulmonar
Primeira mulher a operar o transplante de pulmão no Brasil, a cirurgião torácica do Hospital Dom Vicente Scherer, Fabíola Adélia Perin, se tornou também a primeira mulher a assumir a presidência da Sociedade de Cirurgia Torácica do Rio Grande do Sul (SOCITORS), criada há 27 anos.
O interesse pela especialidade surgiu durante a graduação em Medicina, na Universidade de Caxias do Sul (UCS). A médica conta que teve a sorte de perceber o quanto eram bons os exemplos dos seus mestres e a indicavam para um caminho: a Santa Casa de Porto Alegre, especificamente o Pavilhão Pereira Filho.
“O desafio foi lançado por mim e passei a buscar a residência de Cirurgia Torácica naquele ‘templo’. O desejo genuíno de trabalhar com transplante pulmonar, mesmo que temporariamente, era do tamanho da minha alegria quando fui convidada a estender minha Residência, com dedicação ao transplante pulmonar. O trabalho e a seriedade foram brindados com o convite para fazer parte da equipe pioneira de transplante pulmonar no Brasil, feito pelo Dr. José Camargo. Os desafios são constantes, assim como a satisfação e a recompensa de ver um paciente agradecido por não precisar mais de oxigênio para suas atividades do dia a dia. O transplante é um procedimento de alta complexidade, que exige sintonia da equipe médica, de fisioterapeutas, enfermagem, nutrição, psiquiatria, psicologia e de assistência social, em uma instituição capaz de comportar tamanha complexidade e disposta a essa parceria”, relata.
Assim como o transplante, a presidência da Sociedade de Cirurgia Torácica ocorreu de forma natural, como consequência de dedicação e de seriedade.
“Entendo os desafios como comuns aos gêneros e entre os relatos femininos de dificuldade na carreira cirúrgica, a referência à maternidade e a necessidade de rede de apoio parece ser o fator mais frequente. As oportunidades na Medicina estão para aqueles que se dedicam! Desafios diferentes surgirão para diferentes pessoas, mas acredito que o trabalho e a competência superam os obstáculos”, completou a médica.
Dra. Sandra Fuchs: atuação relevante na área de pesquisa
Professora Titular do Departamento de Medicina Social, da Faculdade de Medicina, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Dra. Sandra Fuchs iniciou a vida profissional como pediatra, migrando progressivamente para a pesquisa. Em 2023, ela recebeu o título de Sócia Benemérita da Associação Médica do Rio Grande do Sul (AMRIGS).
Ao final de 13 anos de prática clínica, passou a se dedicar exclusivamente à carreira acadêmica.
“Adquiri experiência na condução de estudos de casos e controles, completando formação com defesa de tese de Doutorado em diarreia grave no sul do Brasil e ingresso na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Consolidei experiência internacional em pós-doutorado na School of Public Health, Johns Hopkins University em Baltimore, Maryland, Estados Unidos. Como professora visitante do Departamento de Nutrição da Harvard School of Public Health, em Boston, Massachusetts, Estados Unidos, tive oportunidade de interagir com pesquisadores que lideraram a investigação de doença cardiovascular. Entre os vários ensaios clínicos randomizados que coordenei ou participei, destaco o Estudo PREVER, constituído por dois ensaios clínicos randomizados multicêntricos, os quais investigaram prevenção do desenvolvimento de hipertensão, através do tratamento medicamentoso, e controle da hipertensão. Atualmente destaco o Estudo OPTIMAL, que inclui o OPTIMAL DIABETES e o OPTIMAL STROKE, ambos em andamento”, informou.
Em 2015, a médica se tornou Fellow of the American Heart Association, posição obtida mediante eleição por pares. Entre planos, está o de ampliar vínculos inter-institucionais, abrindo oportunidade para propiciar o surgimento de novos talentos em pesquisa.
“Para tal, aceitei e fui eleita para coordenar o Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde: Cardiologia e Ciências Cardiovasculares, da UFRGS, atualmente no segundo mandato. Sou pesquisadora atuante de grupos internacionais de pesquisa, como o NCD Risk Factor Collaboration (NCD-RisC) e o ANDANTE PROJECT, nos quais desenvolvem-se pesquisas com abrangência mundial”, completou.
Em mais de sete décadas de atividade, a Associação Médica do Rio Grande do Sul empenha-se ativamente em evidenciar o papel fundamental da mulher na Medicina e na área da Saúde. Reconhecendo o valor e a contribuição das profissionais femininas, a instituição busca sempre proporcionar um espaço justo para todos, incentivando o crescimento profissional e a congratulação de conquistas. Atualmente, a Diretoria da entidade conta com três médicas em cargos de liderança. Elas são ginecologistas e obstetras, médicas nucleares, médicas do trabalho, e fazem a diferença exercendo suas vocações de forma exímia, proporcionando atendimentos humanizados, colocando os pacientes em primeiro lugar e fortalecendo a classe médica.
A presença de uma líder feminina no Departamento Universitário da AMRIGS também reflete a representatividade e a importância da mulher na área acadêmica, evidenciando o potencial e a capacidade de elas ocuparem posições de destaque e liderança dentro da área da Saúde desde muito cedo. A formação de futuras médicas não apenas amplia a representação feminina na profissão, mas também enriquece o ambiente estudantil e profissional com uma gama mais ampla de jovens talentos e conhecimentos.